Demorei muito
para perceber que eu não era mansa, como todos diziam que eu era. Demorei a
entender que eu posso ser, mas dependendo da minha vontade. Demorei muito para
começar a me enxergar com meus próprios olhos, sem a intervenção alheia.
Demorei a ter uma opinião sobre mim mesma e, agora que as coisas estão se
arranjando, que meus pensamentos estão encontrando lugares certos nesta mente
confusa, eu não vou desistir de me encontrar. Não vou desistir para te agradar.
Se há uma parte em mim que te faz sorrir, ótimo. Mas também há uma face que não
vai te agradar. E não há uma face apenas. Pela primeira vez eu vejo que posso
ser muitas coisas, posso ser muitos lugares e oportunidades. Posso tomar vários
papéis, posso mudar as coisas de lugar. Agora eu vejo que nesta confusão de
personagens, não há nenhuma que eu deva calar. E nem quero. Darei a todas as
vozes que elas merecem. Que eu mereço. Não me culpo pelas minhas vontades, nem
me enalteço. Elas existem e conviverei com elas da maneira que conseguir.
De você,
cidadão de bem, só me resta rir. Da sua prisão, da sua não permissão imposta
por você mesmo. Diabos reprimidos causam estragos. Para você, o certo está tão
longe do errado, não é mesmo? Quem traçou essa linha para você? Quem te disse
que não era digna de questionamentos e possibilidades? Enquanto você estufa o
peito e se enche de certezas, eu me encho de possibilidades, casas vazias,
possíveis sorrisos e gaiolas abertas. Permitir. Você sabe o que é isso? Você já
ousou duvidar?
De todas essas
coisas, apenas uma certeza. Quem fala agora é uma das minhas faces que não se
importa. Uma das minhas preferidas, eu confesso. Mas apenas uma delas. Uma das
feições do espelho. Uma das quais eu posso ser.